quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Nova lei amplia direitos de adolescentes “presos”

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O governo federal  sancionou semana passada a lei que cria o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), com regras para aplicação de medidas socioeducativas a adolescentes. A legislação é equivalente à Lei de Execução Penal, destinada a maiores de 18 anos. Entre as novidades estão a regulamentação de visitas íntimas para os garotos e garotas e a necessidade de o juiz avaliar a privação de liberdade a cada seis meses.
Em 2006, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança (Conanda) já havia aprovado resolução criando o Sinase. Como não havia a força de uma lei, as exigências não eram cumpridas por boa parte dos governantes. O Sinase entra em vigor em 90 dias e as regras deverão ser aplicadas integralmente em, no máximo, um ano.
Sem uma regulamentação geral, cada estado executava a medida socioeducativa a seu modo. Algumas unidades são um anexo ao lado de presídios, outras chegaram a abrigar 2,8 mil adolescentes ou não tinham regras de convivência.
A nova lei estipula a divisão de responsabilidades entre União, estados e municípios, veda a construção de unidades de socioeducação próximas a presídios, prevê atendimento individualizado com poucos jovens no mesmo local e estipula a criação de regras de convivência. A “solitária”, para o isolamento de garotos e garotas, está proibida.

Avanços e críticas

A secretária nacional de promoção dos direitos da criança e do adolescente, Carmem de Oliveira, afirma que o Brasil é o primeiro país do Mercosul – e um dos poucos no mundo – a ter esse tipo de legislação. Além de criar um sistema com informações sobre as unidades e os jovens, o Sinase prevê um sistema de avaliação e monitoramento, semelhante ao usado pelos conselhos tutelares. “Haverá avaliação de indicadores, gestão do orçamento e resultados alcançados, como a reinserção social e reincidência.”
O promotor de Justiça Wilson Tafner, responsável por pressionar o governo de São Paulo a fechar as antigas unidades da Fundação para o Bem-Estar do Menor (Febem), acredita que a lei cria uma possibilidade maior de cobrança. “Há critérios objetivos de financiamento e avaliação. Outro avanço é que os gestores das unidades deverão ter formação superior e a equipe de avaliação deve passar por formação.”
Apesar das conquistas, especialistas argumentam que a lei poderia ter avançado. Vice-presidente da Comissão Nacional da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ariel de Castro Alves diz que a resolução do Conanda trazia um número mínino de adolescentes por unidade (40) e características arquitetônicas, especificações não incluídas na nova lei. Outra crítica trata da falta de uma corregedoria externa para investigar irregularidades.

Retenção prolongada gera crítica e polêmica

Um dos artigos do Sinase gerou polêmica entre especialistas da área da juventude por abrir uma brecha na lei para que adolescentes fiquem privados de liberdade por tempo indeterminado, caso exista algum problema relacionado à saúde mental. A ideia é que o jovem com esse tipo de doença deixe o centro de socioeducação e vá para uma unidade de tratamento psiquiátrico, ficando lá até estar “curado”. Hoje o tempo máximo que um menino ou menina pode ficar privado de liberdade é três anos, mas com a possibilidade de tratamento psiquiátrico esse prazo pode ficar indefinido.
Na seção sobre o atendimento ao adolescente com transtorno mental, o artigo 65 prevê que o juiz pode encaminhar o processo ao Ministério Público para “even­­tual propositura de interdição e outras providências pertinentes.” Na prática, muitos magistrados já tomavam essa medida, mas o temor é que isso se torne a regra, principalmente em casos que envolvem grande repercussão na sociedade.
A possibilidade de interdição já existia para os adultos, assim como o dispositivo da “medida de segurança”, quando o indivíduo é afastado da sociedade em função da periculosidade e recebe tratamento, sem tempo máximo determinado. A pessoa é liberada somente após um laudo médico garantir que ela não oferece mais riscos.
A discussão sobre o tempo máximo de privação de liberdade dos adolescentes ganhou uma grande repercussão em 2003, quando Liana Friedenbach e Felipe Caffé foram assassinados por outro adolescente, o Cham­pinha. Após completar 21 anos e os três anos previstos da medida socioeducativa, ele foi encaminhado a uma unidade experimental do estado de São Paulo, criada para a custódia psiquiátrica de jovens considerados de alta periculosidade. O dispositivo utilizado pela Justiça nesse caso foi a interdição.

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